DA

Poesia à solta

Blogs e sites propagam versos e autores de Brasília.

O Correio passeia pelo infinito universo da web e aponta alguns endereços com criação produtiva

Sérgio Maggio

Patrícia Del Rey e o blog entreaberta: poesia que seduziu elisa lucinda

      A palavra fresta é preciosa no dicionário da jovem atriz Patrícia Del Rey, 26 anos. Ela adora espiar, ser observada e revelar segredos aos poucos. E foi no intervalo de uma apresentação da atriz e poeta Elisa Lucinda, que os versos dela escoaram em público. Na plateia para ouvir a vivência da mestre, a garota pulou no palco quando abriu-se oportunidade para poetas da cidade mostrarem a sua criação. Naquela noite, ela deu o recado:

— Há um vulcão escondido/ De onde brota sangue grosso/ Forte, quente e vivo/ Lágrimas de algo que foi morto/ Ele jorra aos montes/ Escorre entre as minhas pernas/ Limpando a dor ou o amor antigo/ E muitas vezes, suja o meu vestido.

Dita com extrema emoção, a poesia Mensalmente foi visivelmente admirada por Elisa Lucinda e por público diverso. Ao final, Patrícia Del Rey deu o serviço aos que queriam mais: http://entreaberta. blogspot.com.

— Como não tenho livro publicado, o blog virou o suporte que abriga a minha criação diária. Certa vez, conheci o poeta Nicolas Behr e falei sobre a minha produção. Dei o endereço. Ele entrou, leu e me retornou. Comecei em 2007 e hoje tenho entre 1.000 e 1.500 acessos por mês, revela.

Assim como Patrícia, incontáveis “poetas” ocupam a blogosfera em espaço democrático e real para exercitar a verve subjetiva. Como não há filtros editoriais, a preocupação é apenas a de experimentar o contato virtual entre a escrita sensível e o internauta que vaga sedento de novidades.

— O blog é sensacional pela interatividade. Aproxima as distâncias. A tecnologia melhora a relação humana. Também tira a ansiedade de sair da gaveta para se tornar publicado, avalia o poeta Paulo Kauim, que alimenta o http:// paulokauim.blogs.sapo.pt.

— São diversos olhares de pessoas distintas que interagem naquele instante. Desse universo, tem saído gente interessante como Clarah Averbuck. À medida que escrevo, percebo um amadurecimento desses pontos de vista poéticos sobre minhas vivências e cotidianos, observa Patrícia.

Autor do bem-recebido livro de poesia Lâmina do adeus, o poeta e publicitário Leandro Wirz (que trocou recentemente Brasília pelo Rio) fez do seu blog escoamento da produção poética. Às vezes posta imediatamente quando escreve, às vezes deixa maturar na gaveta até enviar para a rede, na qual mantém fiel e qualificado grupo de leitores.

— Ando desanimado em publicar livro impresso, há tantos lançamentos, tanta gente escrevendo e tudo é tão moroso, da edição às vendas. O blog surge por essa necessidade de atualidade, urgência. A poesia chega às pessoas que estão fora do círculo de amigos. Os versos seguem caminhos por mares nunca navegados. É fascinante, conta Leandro Wirz.

Dois espaços virtuais poéticos bem diversificados em Brasília são da escritora Ana Ramiro e da jornalista Liana Aragão. Paulista e autora de Menina-poesia, a primeira administra um portal poético (Folhas de Girapemba), com divulgação de saraus e lançamentos de livros, ensaios e poesias. A outra é cearense-brasiliense que comanda o sugestivo Setor Literário Sul, no qual mistura informação com contos poéticos. Os dois têm credibilidade dos internautas. Sobretudo pelo apuro estético e posts diários.

Ainda sem a tradição de ser vigiados por olheiros virtuais das editoras, os poetas da web têm chance à vista. Até 30 de junho, estão abertas as inscrições para concurso de poesia da internet brasileira no site www.talentos. wiki.br. São R$ 9 mil em prêmios e a publicação dos 70 melhores poemas. Ao inscrever a obra, o concorrente tem ainda a avaliação direta dos internautas, que podem comentar e dar notas.

MAR SEM FIM

Siga a rota de alguns blogs poéticos:

http://ruidoinsano.blogspot.com
Da atriz e diretora Adriana Lodi

MEDITERRÂNEO

Desatinei
Abri o véu
O zíper
Até cantei...
desafinando o desafinado
Como sempre.
E me flagrei destemperada gargalhando
Ao seu som
Que pareceu com o dum mar
Distante.

http://paulokauim.blogs.sapo.pt/
Do poeta e articulador cultural Paulo Kauim

sua
voz
esse
céu
do
cerrado
dentro
de
nós

cantando caetano, police ou nonato veras ela é epifânica
timbre de veludo barroco no terreiro da invenção popular

Célia Porto

http://entreaberta.blogspot.com/
Da atriz e poeta Patrícia Del Rey

NEM DE MIGALHAS, NEM
DE LEMBRANÇAS
SAUDADE NÃO ME BEIJA A NUCA

http://leandrowirz.blogspot.com/
Do poeta Leandro Wirz

GANHOS

Pegue outro pequeno pedaço
do meu coração,
que diferença faz?
O que tive, perdi,
não tenho mais.
Você tem a chance de ser feliz,
não perca este instante.
Não hesite em vender a alma.
Mente quem diz
que temos todo o tempo.
Perca a calma,
perca-se por nós.

http://girapemba.blogspot.com
Da poeta Ana Ramiro

OYÁ

Menina afogueada fruta verde
Virada na ponta do casco
Brasa que anima o toque
ventania da savana
fagulha ligeira que esparrama

É parreira alada, é Matambeira
folha rebelde de aruanda

http://setorliterariosul.blogspot.com/
Da jornalista Liana Aragão

TEREZA XXIX

A amiga da amiga da prima de Tetê é uma besta. Quando o amado quer, ela está disponível. Safadinha. De longe, sofre, se acaba. Mas expõe, orgulhosa, os dentes mais brancos que puder ao cafajeste. Se ele pede. Dengosa, implora atenção, elogio. Volta, perdoa, ama. Amiga da amiga da prima de Tetê. Tão longe, de longe, range as unhas e rói os dentes, agoniada, sem outro destino possível. É mais uma. É amiga, é prima e é Tetê. Inteira rasgada, partida amadora.

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